terça-feira, 5 de maio de 2015

Memória descritiva #2 - Proj. #2

“Typography is the craft of endowing human language with a durable visual form.” (1)
Na unidade curricular de Design e Comunicação Visual foi-nos proposta a realização de uma segunda  proposta de trabalho na qual fomos desafiados a “entender a letra como matéria visual de representação fónica e como grafismo autónomo da sua função textual; reconhecer a capacidade de materializar conceitos, “dar forma” como uma característica da atividade humana; entender a importância dos estudos de composição como forma de conhecimento específico necessário à produção de discursos visuais” e ainda a “entender a relação entre o universo tipográfico e o universo infográfico”.
Nesse sentido tinhamos que desenvolver uma “infografia apenas recorrendo a elementos tipográficos”. Nessa composição a letra tinha que desempenhar um papel estético e simbólico estando sempre associado ao seu valor semântico. O texto escolhido não devia ultrapassar as 500 palavras.
Após realizar uma pesquisa e várias recolhas fotográficas chegou o momento de escolher o artigo para a concretização da proposta. Decidi que queria fazer sobre uma notícia visto que este género de artigo se encontra directamente relacionado com o curso que frequento e, como tal, seria uma mais valia começar a tentar interpretar este tipo de texto de modo diferente -  até porque a infografia é cada vez mais um “género jornalístico”. Rapidamente percebi que queria uma notícia que tivesse um alcance e interesse mundial, que estivesse envolta em sentimentos e emoções pois assim seria muito mais interessante e desafiador tentar representá-la. Queria ainda uma notícia que me permitisse passar uma mensagem forte de consciencialização para o mundo e para a realidade que nos rodeia.  Nesse sentido escolhi uma notícia que encontrei online no seguinte link: http://veja.abril.com.br/blog/acervo-digital/internacional/terrorismo-atentados-que-assustaram-o-mundo/;  e que transcrevo a seguir:

Terrorismo: atentados que assustaram o mundo
Na segunda-feira, o terrorismo voltou a assustar o mundo. Mais de 38 pessoas morreram e outras 60 ficaram feridas em atentados perpetrados por duas mulheres-bomba em estações centrais do metrô de Moscou. O governo russo acusa grupos separatistas do Cáucaso do Norte de planejarem os ataques – apesar de nenhum grupo ter assumido a autoria das ações até o momento.
O primeiro grande atentado do século XXI ocorreu em 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos. Na ocasião, o país mais poderoso do mundo viu ícones de sua identidade nacional serem alvejados com desconcertante facilidade. Dois aviões sequestrados por terroristas da rede Al-Qaeda puseram abaixo as torres gêmeas do World Trade Center. Uma terceira aeronave foi lançada sobre o Pentágono, sede do poder militar dos EUA, nos arredores de Washington. No total, mais de 5.000 pessoas morreram. Os ataques mudaram a cara do terror internacional.
Em 2004, o 11 de março teve para os espanhóis o mesmo peso que o 11 de setembro teve para os americanos – o dia da infâmia terrorista. Naquela data, uma série de bombas explodidas em trens metropolitanos matou mais de 200 pessoas e deixou quase 1.500 feridos em Madri. Foi a maior carnificina numa grande capital europeia desde a II Guerra Mundial. O crime monstruoso, perpetrado contra vítimas inocentes a caminho do trabalho, deixou uma dúvida: o autor. Inicialmente, o governo espanhol acusou o grupo separatista basco ETA. Mais tarde surgiram indícios de que se poderia tratar de nova investida dos fanáticos da Al Qaeda.
O ano de 2004 também marcou o terrorismo na Rússia. O assalto a cerca de 1.200 inocentes aconteceu em Beslan e teve início quando três dezenas de terroristas invadiram o ginásio de uma escola, onde pais e alunos comemoravam o primeiro dia de aula do ano letivo russo. A ação terrorista durou três dias e só terminou quando forças policiais russas mataram a maioria dos terroristas e libertaram os reféns sobreviventes. Em uma primeira contagem foram encontrados mais de 200 mortos, incluídos os adultos. Mais de 700 feridos foram atendidos em hospitais e tendas médicas improvisadas. O ataque foi perpetrado por terroristas chechenos e árabes.
Um ano mais tarde foi a vez de Londres. Em julho de 2005, uma série de bombas no sistema de transporte público da capital londrina acrescentou nova data ao calendário da infâmia. Foram quatro explosões, três delas em trens do metrô e a última no interior de um ônibus. Detonados de forma coordenada no horário de maior movimento na área central da cidade, deixaram mais de 50 mortos e 700 feridos, muitos em estado grave. Londres constituiu-se em alvo óbvio por reunir características que o fundamentalismo muçulmano abomina. Um grande centro financeiro mundial, síntese do Ocidente e do capitalismo moderno, metrópole cosmopolita, tolerante com a diversidade humana e berço da democracia. Por fim, o governo inglês foi o único dos grandes da Europa que seguiu o ex-presidente americano George W. Bush no Iraque.
Em um dos atentados mais recentes, a Índia foi o palco do terror. Em 2008, um grupo de cerca de trinta terroristas espalhou-se pela área turística de Mumbai num frenesi de massacres em pontos diferentes da cidade. Por fim, os terroristas se entrincheiraram em três locais: os hotéis Taj Mahal e Oberoi-Trident, os mais luxuosos da cidade, e em um centro religioso judaico localizado em uma galeria comercial, fazendo centenas de reféns. O saldo final ultrapassou os 200 mortos e 400 feridos.”
Esta notícia prendeu-me desde logo a atenção pelo seu título forte e sensacionalista. É um conteúdo noticioso que não deixa ninguém indiferente e era exactamente isso que eu procurava.
Após várias tentativas de representação infográfica, utilizando apenas elementos tipográficos, este foi o resultado final:



Resolvi destacar várias palavras presentes neste artigo de origem jornalística por acreditar que estas “resumiam” o teor do mesmo: terrorismo; atentados; ataques; bombas; carnificina; crime monstruoso; terroristas; invadiram; massacres; terror; infâmia; vítimas inocentes; mataram; explosões; palco de terror; Al-Qaeda. Como a tipografia não abrange só letras resolvi também seleccionar alguns números que remetem para as vítimas mortais e para os anos no qual ocorreram os atentados: 2001; 2004; 2005: 2008; 50 mortos; 200 mortos e 5000 morreram. Apesar de considerar que todos estes elementos tipográficos caracterizam bem o teor do artigo resolvi salientar alguns pela sua relevância. Deste modo destaquei as datas nas quais ocorreram os genocídios e as palavras  “carnificina”, “massacres”, “terror” e “Al-Qaeda”.

Escolhas ao nível da tipografia
"O texto do título é muitas vezes o elemento tipográfico mais importante na composição, uma vez que atrai rapidamente a atenção do autor potencial pela sumarização do conteúdo". (4)
Ao longo das pesquisas que efectuei deparei-me com esta afirmação e percebi que se tivesse que seleccionar uma só palavra para definir esta notícia seria “massacre”. Acima de tudo por ser uma palavra forte, que causa impacto e que nos remete para mil ideias e sensações. Como tal, resolvi usar esta palavra como se fosse o título da minha composição e centralizei-a, de modo a conferir-lhe um maior destaque.
"O alinhamento centralizado é usado mais efetivamente com (...) grandes títulos ou cabeçalhos, como em cartazes". (4)
Além disso, e para intensificar ainda mais, escolhi uma fonte que dá a sensação que os caracteres foram escritos a partir de sangue. Assim, pretendia realçar a violência dos actos terroristas e a desumanidade a eles associada. Como queria evidenciar o termo “massacre” achei que todos os outros deviam estar associados a outra(s) fonte(s). Assim, escolhi três fontes distintas para a realização desta composição. A do “título”, como já referi, foi eleita por sugerir sangue enquanto que, as outras duas, foram seleccionados por encaminharem para a ideia de arrasamento e de exterminação.
"(...) Os títulos são submetidos a kerning e a espaçamento entre letras muito mais do que os blocos de texto. Isso força as letras a se agruparem oticamente em manifestações visuais mais fortes". (4)
As duas fontes utilizadas nas palavras possuem um espaçamento entre cada caractere grande para produzir um impacto visual mais forte e para criar a ilusão que tudo está agrupado e relacionado entre si.
"A maior vantagem para a composição não justificada é a capacidade de controle do espaço entre palavras (…) O espaçamento entre palavras é também mais apertado (…) para obter maior legibilidade e impacto visual". (4)"O espaço entre palavras mais apertado dá mais rapidez ao processo de leitura e permite que o leitor absorva pensamentos e frases em vez de palavras isoladas, o que ajuda a manter mais altos os níveis de compreensão". (4)
Reuni todas as expressões do “corpo do texto” de modo aleatório de forma a representar a confusão, o pânico e o desespero que os ataques terroristas provocaram. Com isto pretendia estimular o pensamento de quem visualizasse a composição, captando assim a sua atenção e o seu olhar. As palavras encontram-se meias destruídas para simbolizar a destruição.
"(...) o kerning mais apertado facilita ao cérebro reconhecer os grupos de letras como palavras, o que resulta em uma leitura mais rápida e fácil". (4)
Como já referi usei três fontes todas elas diferentes. Já justifiquei duas delas, faltando-me a que usei nos números, ou seja, nas datas em que os atentados ocorreram. Neste caso optei por uma fonte que produzisse a ideia estilhaços e, consequentemente, de explosões. Esta fonte permite ainda que cada caracter seja interpretado como sendo uma só palavra, ou seja, como um todo.
Apesar das três fontes serem distintas entre si possuem pontos comuns proprositados: nenhuma possui caudais ou bandeiras, serifas ou ganchos pois estes são considerados "acréscimos elegantes" o que não simboliza, de todo, o teor da notícia.
"O modo como o olho e o cérebro humanos percebem, processam e interpretam a informação visual proporciona uma base sólida para os fundamentos do design de tipos". (4)
Escolhas ao nível da cor

“Uma vez satisfeitas as demandas de legibilidade e de ordenação lógica,a homogeneidade da cor é o objetivo mais comum almejado pelo tipógrafo.E isso depende de quatro fatores:o desenho do tipo, o espacejamento das letras, das palavras e das linhas. Nenhum é independente do outro” (1)
Depois de criar a composição surgiu o problema das cores que queria utilizar. As cores têm um poder imenso, transmindo por si só ideias, valores e pensamentos. A cor reveste-se assim de importância pela sua dimensão própria e pela sua capacidade de deliniar áreas. Quando visualizamos seja o que for a cor actua sobre o nosso cerebro conduzindo o nosso olhar daí que, a escolha das cores a utilizar, fosse um ponto tanto ou mais importante que a escolha da tipografia.
"Discovery of relationships, mediated by the eye and brain, between color agents and color effects in men, is a major concern of a artist". (2)"Colors have dimensions and directionality of their own, and delineate areas in their own way". (2)
Escolhi usar vermelho para o termo principal pois este remete para o fogo e para o sangue que encheram os locais do atentado. Esta cor está associado ao perigo, à agressão, à raiva, à crueldade e à imoralidade. Todos estes adjectivos estão relacionados com o tema da notícia, caracterizando perfeitamente a natureza dos actos. Além disso a nível visual esta é a cor mais dominante de todas sugerindo acção e velocidade graças ao seu carácter intenso e agressivo.
No resto das expressões usadas na composição optei por usar o preto por esta ser a cor da morte, do medo, da negatividade, da maldade, da melancolia, do luto e do vazio.
Já o fundo possui a cor branca de modo a evidenciar as outras cores usadas e por esta estar ligada a sentimentos como a solidão e a fragilidade.
Mais do que isso, a utilização do vermelho e do branco permitiu-me conferir/reforçar o drama inerente ao tema em questão - "Red looks very dark on white, and its brilliance scarcely asserts itself" (2) - enquanto que o preto permitiu-me que as palavras se destacassem por si só - "The eye and the mind achieve distinct perception through comparison and contrast" (2) .
A verdade é que muitas vezes ignoramos o poder da tipografia mas, com esta composição, espero ter conseguido demonstrar a importância que esta pode tomar na compreensão de um artigo - seja ele de que género for. Deste modo pretendia, apenas a partir do uso de caracteres e cores, transmitir algo mais do que apenas informação: transmitir uma mensagem que suscitasse sentimentos e impressões. A notícia na sua totalidade surge no fundo da composição em marca d’água.
“Readers usually ignore the typographic interface, gliding comfortably along literacy’s habitual groove. Sometimes, however, the interface should be allowed to fail. By making itself evident, typography can illuminate the construction and identity of a page, screen, place, or product.” (3)

Citações
(1) – BRINGHURST, Robert.
(2) - ITTEN, Johannes –The Art of Color : The Experience and Objective Rationale of Color. United States of America: Van Nostrand Reinhold Company, 1970.
(3) – LUPTON, Ellen.
(4) – CLAIR, Kate Clair & BUSIC-SNYDER, Cynthia – Manual de tipografia: A História, a Técnica e a Arte. 2ª ed. São Paulo: Bookman Companhia Editora, 2005. 

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